18 de abr. de 2011

A Trindade, Lúcifer e o Processo de Individuação - Por Carl Gustav Jung


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Como fruto saído do pensamento, a Trindade deriva de uma necessidade de evolução exigida pela emancipação do espírito humano. Na história dos povos é sobretudo dentro da  Filosofia escolástica que esta tendência sobressaiu, constituindo como que um exercício preliminar que tornou possível o pensamento dos tempos modernos. A tríade é também um arquétipo, e como força dominadora não apenas favorece uma evolução espiritual, como a obriga, em determinadas circunstâncias. Mas logo a espiritualização ameaça assumir um caráter unilateral e prejudicial à saúde, e neste caso o significado compensatório da tríade passa inevitavelmente para o segundo plano. O Bem não se torna melhor, mas pior, quando se exagera o seu valor, e um Mal de pouca monta se torna grande, quando se lhe não presta a devida atenção e é recalcado. A sombra é uma componente da natureza humana, e só à noite não há sombra. Por isso a sombra é um problema.

http://3.bp.blogspot.com/_eXA1mwtxYV8/S5JBm6HTHEI/AAAAAAAAAIk/W7XEG_Ohmdk/s320/02a%C3%A7ao+da+trindade.jpgComo símbolo psicológico, a Trindade significa, primeiramente, a homoousia ou essência de um processo que se desenvolve em três etapas e que podemos considerar como fases de um amadurecimento inconsciente no interior do indivíduo. Nesta perspectiva, as três Pessoas divinas são personificações das três fases de um acontecimento psíquico regular e instintivo, que tem uma tendência a expressar-se sempre sob a forma de mitologemas e através de costumes rituais, como p. ex. nas iniciações da puberdade e da vida masculina, nas ocasiões de nascimento, de casamento, de doença e morte. Os mitos e os ritos, como nos mostra p. ex. a medicina do antigo Egito, têm significado psicoterapêutico - até mesmo em nossos dias. 288 Em segundo lugar, a Trindade indica um processo secular de tomada de consciência. Em terceiro lugar, a Trindade não quer apenas representar, p. ex., a personificação de um processo em três etapas, mas ser, de fato, o único Deus em três Pessoas, as quais possuem conjuntamente uma só e mesma natureza divina, pois em Deus não há passagem da potência ao actus, da virtualidade à realidade; pelo contrário, Deus é a pura realidade, o próprio actus purus. As três Pessoas divinas só se diferenciam pelo modo distinto de suas origens, pelas respectivas processões (o Filho gerado pelo Pai e o Espírito Santo espirado conjuntamente pelos dois - procedit a patre filioque). A homoousia, cujo reconhecimento atravessou tantas lutas, é absolutamente imprescindível do ponto de vista psicológico, pois a Trindade, enquanto símbolo psicológico, é um processo de mutação de uma só e mesma substância, isto é, da psique como um todo. A consubstancialidade do Filho, juntamente com o filioque, indica-nos que Cristo, o qual deve ser considerado psicologicamente como um símbolo do Si-mesmo, e o Espírito Santo, que deve ser entendido como a realização do Si-mesmo, a partir do momento em que é dado ao homem, procedem da mesma substância do Pai, isto é, indica-nos que o Si-mesmo é [uma realidade consubstancial ao Pai]. Esta explicação está de acordo com a constatação de que é impossível distinguir, empiricamente, os símbolos do Si-mesmo da imagem de Deus. A Psicologia pode apenas constatar esta impossibilidade, e nada mais. É digno de nota que a constatação "metafísica" ultrapassa muito a constatação psicológica. A referida impossibilidade de diferenciar nada mais é do que uma constatação negativa, que não exclui a existência de alguma diferença concreta. O que acontece, talvez, é que não se perceba mais tal diferença.

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg2mWo1HJUcY04O7klANZxXn-K4DAvDOZLl_cSWyDZ59ARVOqFevaBkYetHDDEFKG1g-v653hepSPptapkCOf9M09V7L-WF5Zaeh84CwHEC-nGvr5WAGRtYgYHhKgUboM7nXvnfP8JNbdk/s640/trinity-brahma-vishnu-and-shiva-HA21_l.jpgO enunciado dogmático, ao invés, fala-nos de uma filiação "divina" que o Espírito Santo comunica aos homens e que, em si, não se distingue da filiatio Christi (filiação de Cristo). Daí se conclui como foi importante que a homoousia vencesse a homoiousia (a semelhança de natureza). Isto quer dizer que com a recepção do Espírito Santo, o Si-mesmo do homem entra numa relação de consubstancialidade com a divindade. Como bem mostra a história eclesiástica, esta conclusão é sumamente perigosa para a existência da Igreja e este foi um dos motivos principais pelos quais a Igreja não insistiu em aprofundar a doutrina do Espírito Santo: em caso negativo, um desenvolvimento posterior levaria necessariamente a cismas destruidores e, em caso positivo, conduziria diretamente à Psicologia. Além do mais, havia uma série de dons que não eram aceitos irrestritamente pela. Igreja, como nos indica o pr6prio Paulo. Segundo Tomás de Aquino, os dons espirituais não estão ligados à bondade dos costumes ou a virtudes morais do indivíduo. Por isso a Igreja se reserva o direito de dizer quando algo é fruto da ação do Espírito Santo, e quando não é. Com isto ela retira do leigo a possibilidade, para ele nem sempre oportuna, de decidir por si mesmo a este respeito. Os Reformadores também perceberam que o Espírito "sopra onde quer", como o vento. Não é somente a primeira Pessoa da divindade, mas também a terceira, que se assemelha a um Deus absconditus [Deus escondido] e, por conseguinte, suas ações, como. as do fogo, ora são benéficas, ora prejudiciais quando encaradas de um ponto de vista meramente humano. Mas é justamente acerca deste último aspecto que a Ciência se baseia, a qual só consegue aproximar-se do que é estranho à sua natureza, tateando e com grande dificuldade.


A "criação", isto é, a matéria, não se acha incluída na fórmula geral da Trindade, pelo menos da maneira explícita. Por isso em relação à matéria só há duas possibilidades; ou ela é real, e por isso se acha envolvida no actus purus divino, ou é irreal, mera ilusão, e portanto se acha excluída da realidade. Mas contra esta última conclusão há, de um lado, o fato da Encarnação de Deus e a obra de Redenção em geral, e do outro, a autonomia e a eternidade do "Príncipe deste mundo", isto é, do Diabo, que foi apenas vencido, mas de modo algum destruído e que por ser eterno não pode ser destruído. Se a realidade da criação se acha incluída no actus purus também o Diabo aí se encontra - como seria preciso provar. Desta situação resulta uma quaternidade, mas uma quaternidade diferente daquela que foi anatematizada pelo Quarto Concílio de Latrão. - A questão que aí se tratava era a de saber se a essência de Deus exige ou não uma existência autônoma ao lado da existência das três Pessoas.

http://www.desideratto.com/wp-content/uploads/anjo-caido.jpgNo caso que tratamos a questão é a autonomia da independência, da criatura, que por si mesma é autônoma e eterna, isto é, trata-se do Anjo rebelde. Ele é a quarta figura antagônica na lista dos símbolos, cujos intervalos correspondem às três fases do processo trinitário. Da mesma forma, o Adversário, no Timeu, é a segunda componente do par contradit6rio, sem a qual não existe a totalidade da alma do mundo; aqui também o Diabo se acrescenta à tríade na qualidade de τό έν τέταςτν (o Uno [na qualidade de] quarto), para formar a totalidade absoluta. Se entender-se a Trindade como um processo, como tentei fazê-lo acima, este processo deveria prolongar-se até chegar à totalidade absoluta, com o quarto elemento. Mas com a intervenção do Espírito na vida dos homens, estes são inseridos no processo divino e, conseqüentemente, também no princípio de individuação e de autonomia em relação a Deus, princípio este que vemos personificado em Lúcifer, como vontade que se opõe a Deus. Sem Lúcifer não teria havido criação, e nem menos ainda uma história da salvação. A sombra e a vontade oponente são condições imprescindíveis para aquela realização. O ser que não tem vontade pr6pria ou, eventualmente, uma vontade contrária à do seu Criador e qualidades diversas das dele, como as de Lúcifer, não possui existência autônoma, não estando em condições de tomar decisões de natureza ética. Quando muito, é um mecanismo de relógio ao qual o Criador deve dar corda, para poder funcionar. Por isso Lúcifer foi quem melhor entendeu e quem melhor realizou a vontade de Deus, rebelando-se contra Deus e tornando-se assim o princípio de uma criatura que se contrapõe a Deus, querendo o contrário. Porque assim o quis, Deus dotou o homem, segundo Gênesis 3, da capacidade de querer o inverso do que Ele manda. Se assim não fosse, Ele não teria criado mais do que uma máquina, e neste caso a Encarnação e a Redenção do mundo estariam inteiramente fora de cogitação e a Trindade não se teria revelado, pois todas as coisas continuariam sendo apenas o Uno.


 

A lenda de Lúcifer não é em absoluto uma história de fadas do mesmo modo que a hist6ria do Paraíso. Tanto um como outra são mitos "terapêuticos". Naturalmente há quem se insurja contra a idéia de que o Mal e seus efeitos se achem incluídos em Deus, pois acham impossível que ele tenha desejado tal coisa. É verdade que devemos precavermo-nos de limitar a onipotência divina, baseados numa concepção humana subjetiva; entretanto e apesar de tudo, é isto precisamente o que pensamos. Mas não se trata de atribuir todos os males à divindade. Graças à sua autonomia moral, o homem pode imputar a si mesmo uma parte considerável de tudo o que de menos bom acontece. O Mal é relativo; em parte é evitável e em parte é uma fatalidade. Isto se aplica também à virtude, e falarmos da santidade pessoal] (Cf. De Veritate, XII, a: Suma Teológica, I - II, p. 172, a 4). Tirei esta observação de um artigo sobre St. Thomas's Conception of Revelation, da autoria de P. Victor White O. P. (Oxford). O autor colocou seu manuscrito gentilmente ao meu dispor. 2 O Axioma de Maria. Veja-se Psychologie und Alchemie, 1952, p. 2245. Obras completas, vol. 12, § 209ss. muitas vezes não sabemos o que é pior. Pense-se p. ex. no destino de uma mulher casada com um homem notoriamente santo! Que pecados os filhos não terão de cometer para poderem sentir sua própria vida, frente à influência avassaladora de pais como estes! Enquanto processo energético, a vida precisa de pólos contrários, sem os quais, como sabemos, é impossível haver energia.

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O Bem e o Mal nada mais são do que os aspectos morais destas antinomias. O fato de não podermos ver estes últimos senão sob este prisma dificulta consideravelmente o desenrolar da vida humana. Este sofrimento, que acompanha inevitavelmente nossa vida, é incontornável. A tensão polar que gera a energia é uma lei universal, expressa com adequação no yang e yin da filosofia chinesa. O Bem e o Mal são sentimentos de valor do âmbito humano que não podemos estender além. Para lá destes limites, o que ocorre não é atingido pelo nosso julgamento. Não se pode aprender a divindade com tributos humanos. Onde ficaria, aliás, o temor de Deus, se só pudéssemos esperar do Deus o "bem", isto é, aquilo que nos parece ser "bom"? A condenação eterna não corresponde muito à bondade tal como a entendemos! Embora o Bem e o Mal sejam permanentes como valores morais, precisam, entretanto, passar por uma revisão psicológica: muita coisa que pelos seus efeitos nos parece fundamentalmente má não provém absolutamente de uma malícia humana correspondente, mas de uma ignorância profunda e de uma falta de senso de responsabilidade. É por isso que chamamos de Bem o que muitas vezes produz os mesmos efeitos que o Mal. Basta pensarmos nas devastadoras conseqüências da proibição americana de fabricar e vender álcool, ou nos cem mil autos de fé da Espanha, que partiram de um louvável zelo pela salvação das almas. Uma das raízes mais fortes do Mal é a inconsciência e é por isto que eu tanto gostaria de que o Logion [dito] de Jesus, já  encionado: "Se sabes o que fazes, és feliz; se não sabes, és maldito", se encontrasse ainda no Evangelho, ainda que só se ache registrado uma vez. Gostaria de antepô-lo como epígrafe a uma renovação moral.

http://3.bp.blogspot.com/_OdpVE177lMA/THLpCzPv2NI/AAAAAAAAAMQ/ZHEWp4nzvjc/s320/espelho25.jpgO desenrolar do processo de individuação começa em geral com uma tomada de consciência da "sombra", isto é, de uma componente da personalidade que, ordinariamente, apresenta sintomas negativos. Nesta personalidade inferior está contido aquilo que não se enquadra ou não se ajusta sempre às leis e regras da vida consciente. Ela é constituída pela "desobediência" e por isso é rejeitada não só por motivos de ordem moral, mas também por razões de conveniência. Uma cuidadosa investigação mostra-nos que aí se acha, entre outras coisas, pelo menos uma função que deve cooperar na orientação psicológica consciente. Ela coopera, não movida por objetivos conscientes, mas por tendências inconscientes, cuja finalidade é de natureza diversa. Refiro-me à quarta função, dita função de valor secundário, que é autônoma em relação à consciência e se acha a serviço de objetivos conscientes. É ela que está à base de todas as dissociações neuróticas e só pode ser integrada na consciência, quando os conteúdos inconscientes correspondentes se tornam simultaneamente conscientes. Mas esta integração só pode realizar-se e tornar-se proveitosa quando se reconhecem, de algum modo, e com o devido senso critico, as tendências ligadas ao processo, tornando-se possível sua realização.

Isto leva à desobediência e à rebelião, mas leva também à autonomia, sem a qual a individuação não é possível. Infelizmente a capacidade de querer outra coisa terá de ser real, se é que a Ética tem um sentido. Quem se submete, a priori, à lei ou à expectativa geral, comporta-se como o homem da Parábola, que enterrou o seu talento. O processo de individuação constitui uma tarefa sumamente penosa, em que há sempre um conflito de obrigações, cuja solução supõe que se esteja em condições de entender a vontade contrária como vontade de Deus. Não é com meras palavras, nem com auto-ilusões cômodas que se enfrenta o problema, porque as possibilidades destrutivas existem em demasia. O perigo quase inevitável consiste em ficar mergulhado no conflito e, conseqüentemente, na dissociação neurótica. É aqui que intervém beneficamente o mito terapêutico, com sua ação libertadora, mesmo quando não encontremos qualquer vestígio de sua compreensão. É suficiente - como sempre foi - a presença vivamente sentida do arquétipo. Esta só falha quando a possibilidade de uma compreensão consciente parece exeqüível e não se concretiza. Em tais casos, é simplesmente deletério permanecer inconsciente, embora seja precisamente isto o que acontece hoje em dia, em ampla escala, na civilização cristã. Muito daquilo que a simbólica cristã ensinava está perdido para um imenso número de pessoas, sem que hajam percebido aquilo que perderam. A cultura, p. ex., não consiste no progresso como tal, nem na destruição insensata do passado, mas no desenvolvimento e no refinamento dos bens já adquiridos.

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A religião é uma terapêutica "revelada por Deus". Suas idéias provêm de um conhecimento pré-consciente, que se expressa, sempre e por toda parte, através dos símbolos. Embora nossa inteligência não as apreenda, elas estão em ação porque nosso inconsciente as reconhece como expressão de fatos psíquicos de caráter universal. Por isso basta a fé, quando existe. Toda ampliação e fortalecimento da consciência racional, entretanto, leva-nos para longe da fonte dos símbolos. É a sua prepotência que impede a compreensão de tais símbolos. Tal é a situação que enfrentamos em nossos dias. Não se pode fazer a roda girar para trás, nem voltar a acreditar obstinadamente naquilo "que sabemos não existir". Mas bem poderíamos prestar atenção ao significado real dos símbolos. Isto nos permitiria não apenas conservar os tesouros incomparáveis da Cultura, como também abrir um novo caminho que nos devolveria às verdades antigas, as quais, por causa do caráter singular de sua simbólica, desapareceram de nossa "razão". Como pode um homem ser Filho de Deus e ter nascido de uma Virgem? Isto é como que uma bofetada em plena face. Entretanto, um Justino Mártir não mostrou a seus contemporâneos que eles atribuíam tais coisas a seus heróis, e com isto não encontrou audiência junto a eles? Isto aconteceu porque, para a consciência daquela época, tais símbolos não eram tão desconhecidos como para nós. Hoje em dia, esses dogmas encontram ouvidos moucos, pois já não existe mais nada que corresponda a tais afirmações. Mas se tomarmos essas coisas como são, isto é, como símbolos, teremos forçosamente de admirar sua verdade profunda e declarar-nos gratos àquela Instituição que não somente as conservou, mas as desenvolveu através dos dogmas. Ao homem de hoje falta a capacidade de compreensão, que poderia ajudá-lo a crer.

Se ousamos aqui submeter antigos dogmas, que se nos tornaram estranhos a uma reflexão psicológica, não o fizemos com a pretensão de saber tudo melhor que os outros, mas sim movidos pela convicção de que é impossível que o dogma, pelo qual se combateu durante tantos séculos, seja uma fantasia oca e sem sentido. Para isso situei-me na linha de consensus omnium [consenso universal], isto é, de arquétipo. Foi somente isto que me possibilitou uma relação direta com o dogma. Como "verdade" metafísica ele me era inteiramente inacessível, e julgo lícito supor que eu não tenha sido o único ao qual isto aconteceu. O conhecimento dos fundamentos arquetípicos universais me animou a considerar o quod semper, quod ubique, quod ab omnibus creditum est como fato psicológico que ultrapassa o quadro da confissão de fé cristã, e tratá-lo simplesmente como objeto das Ciências físicas e naturais, como um fenômeno puro e simples, qualquer que seja o significado "metafísico" que lhe tenha sido atribuído. Sei por experiência própria que este último aspecto jamais contribuiu, por pouco que fosse, para a minha fé ou para a minha compreensão. Ele não me dizia absolutamente nada. Entretanto, tive de reconhecer que o Símbolo de fé possui uma verdade extraordinária pelo fato de ter sido considerado, durante dois milênios, por milhões e milhões de pessoas, como um enunciado válido daquelas coisas que não se podem ver com os olhos, nem tocar com as mãos. Este fato deve ser bem entendido, porque da "Metafísica" só conhecemos o produto humano, quando o carisma da fé, tão difícil de ser mantido, não afasta de nós toda dúvida e, conseqüentemente, nos liberta de toda angustiosa investigação. É perigoso que tais verdades sejam tratadas unicamente como objeto de fé, pois onde há fé, ali também está presente a dúvida, e quanto mais direta e mais ingênua é a fé, tanto mais devastadoras são as idéias quando a primeira começa a eclipsar-se. Em tais ocasiões é que nos mostramos mais hábeis do que as cabeças enevoadas da tenebrosa Idade Média; e então acontece que a criança é despejada juntamente com a bacia em que foi lavada.

Apoiado nestas e noutras considerações de natureza semelhante é que mantenho sempre uma atitude de extrema cautela, ao abordar outros significados possíveis, ditos metafísicos, da linguagem arquetípica. Nada as impede de que eles cheguem afinal de contas até a base do mundo. Nós é que seremos tolos se não o percebermos. Assim pois não posso presumir que uma investigação do aspecto psicológico tenha esclarecido e resolvido definitivamente o problema dos conteúdos arquetípicos. Na melhor das hipóteses, o que fiz talvez não passe de uma tentativa mais ou menos. Penso aqui no ponto de vista protestante da sola fide. bem ou mal sucedida de abrir um caminho que permita compreender um dos lados acessíveis do problema. Esperar mais seria uma temeridade. Se, pelo menos, conseguir manter viva a discussão, meu objetivo já se acha mais do que cumprido. Ou por outra, se o mundo viesse a perder de vista estes enunciados, estaria ameaçado de um terrível empobrecimento espiritual e psíquico.

Obra Completa: Carl Gustav Jung - Interpretação Psicologica Do Dogma Da Trindade


“Ninguém vai ao Pai, senão por Mim” (Jo 14,6)

“Eu, Jesus, enviei o meu anjo, para vos testificar estas coisas nas igrejas. Eu sou a raiz e a geração de Davi, a resplandecente estrela da manhã.” (Apocalipse 22:16)


  

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