22 de jan. de 2012

Cristo

Bem disse Cristo:


“Ninguém pode chegar ao Pai, senão por mim.”


Esta é a verdade, pois onde poderemos ver o Pai, senão no Filho? Todo ser humano, por mais pobre e mísero que seja, é um templo de Deus, um reflexo de Deus que enche o universo, mas que se manifesta por intermédio de um verdadeiro instrutor.Todos nós reconhecemos que Deus existe, embora não o vejamos nem o compreendamos; porém se compararmos um genuíno Instrutor com o conceito que temos formado de Deus resultará que o caráter do Instrutor supera o nosso conceito de Deus e verificamos que não podemos formar um conceito que supere o caráter do Instrutor que se nos manifesta como encarnação pessoal de Deus. A divina encarnação dos judeus, que nela creram, foi Cristo. Quando Cristo nasceu, os judeus se achavam em um estado de estagnação e só se ocupavam de minúcias e pormenores, sem dar atenção ao essencial. Cristo velo ao mundo, para dar um novo Impulso à humanidade, na Palestina. Os fariseus e saduceus podiam ter sido hipócritas e ter feito o que não deviam, porém foram a causa e o Instrutor Cristo foi o efeito. Embora os rituais, a liturgia, as cerimônias, as formalidades e por menores acessórios da religião, às vezes, causem riso, acumulam não pouca energia e, precisamente, esta energia estava acumulada no formalismo religioso dos judeus. Rodeados de inimigos por todos os lados, estavam recolhidos no recinto onde foram encerrados pela força militar dos romanos e a mentalidade dos gregos; não obstante, conservavam a energia racial, até hoje mantida pelos seus descendentes. Não era possível que essa energia ficasse comprimida por muito tempo; por isso encontrou sua expansão no cristianismo, no Instrutor Jesus de Nazareth, apelidado a Cristo, como a Gautama apelidaram o Buda. Cada Instrutor surge em harmonia com a época, como criação do passado de sua raça e iniciador da futura. A causa de hoje é o efeito do passado e causa do futuro. Nesta situação se encontra o Instrutor, que encarna aquilo que de melhor e mais nobre há em sua raça, sendo ao mesmo tempo o impulsionador do futuro da humanidade. Por isso disse: "Não crede que vim mudar a lei, mas sim cumpri-la." Devemos considerar que Jesus, o Cristo, era oriental, embora os pintores se empenhem em figurá-lo com olhos azuis e cabelos louros. Também a Bíblia é oriental em seus dois testamentos; aliás, suas descrições, comparações, imagens e metáforas denotam estilo oriental. As cenas, os lugares, as atitudes, os personagens, a linguagem poética que nos fala do aguilhão, do deserto, dos vales com seus lírios, do brilhante firmamento, dos rebanhos, das mulheres que com o cântaro na cabeça vão buscar água no poço, dos moinhos, dos arados e de tudo quanto atualmente se vê na Ásia, como prova do primitivo trabalho do homem, tudo isso é oriental. A voz da Ásia tem sido a voz da religião. A voz da Europa tem sido a voz da Política. Cada um é grande em sua própria esfera. A voz da Europa é a voz da antiga Grécia. Para os gregos sua nação era tudo. Quem não falava sua língua era bárbaro e não tinha direito à vida. Segundo os gregos, tudo isso que faziam era justo e perfeito; o resto que se fazia no mundo era incorreto.


Não obstante, eram intensamente humanos em suas simpatias, intensamente naturais e, portanto, profundamente artistas. O grego vive por completo neste mundo. Não sonha. Até sua poesia é prática. Seus deuses e deusas são intensamente humanos, com todas as paixões, sentimentos e emoções do homem. Ama a beleza do mundo externo, das montanhas e das neves, das flores e das aves. Como foram os mestres dos posteriores povos europeus, a voz da Europa é um eco da Grécia. Na Ásia, porém, a religião é uma coisa prática, tal como foi a vida de Cristo, como legítimo filho do Oriente: intensamente prática. Seu reino não é deste mundo, não se preocupa com as coisas perecíveis deste mundo e nem tem onde reclinar a cabeça. Não se entretém em interpretar os textos das Escrituras, mas sim em exortar aos povos que se preparem porque o reino dos céus se aproxima e o fim pode colhê-los de surpresa. Cristo não fez da religião capa e máscara da vaidade, como se costuma fazer atualmente; a prova de que os cristãos não compreenderam o caráter de seu predileto Instrutor está em que uns o qualificam de revolucionário e comunista, outros o consideram o modelo do patriotismo judaico e outros ainda, de hábil político. Entretanto, não há nos Evangelhos nada que justifique estas suposições; ao contrário, Ele aconselha a dar a César o que é de César, afirmando com isto o princípio da autoridade civil e não fazendo distinção entre gentios e judeus. O melhor comentário da vida de Cristo é a sua própria vida e atualmente, os cristãos anseiam pelas riquezas, pelo poderio, a fama, a posição social, quando deveriam modificar sua conduta a fim de não profanar com ela o nome do seu Instrutor. Cristo não viveu ligado por laços de família. Quando lhe disseram que sua mãe e seus irmãos o esperavam fora, não se deteve para saudá-los nem os fez chegar onde Ele estava exclamando: "Quem é minha mãe e quem são meus irmãos - "E estendendo a mão para os seus discípulos, disse: "Eis aqui minha mãe e meus irmãos, porque todo aquele que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe.” E nas bodas de Canaã, quando sua mãe lhe disse. que havia acabado o vinho, Ele respondeu: “Que tenho eu contigo, mulher? Minha hora ainda não chegou.". Cristo não tinha a sensação de sexualidade, nem havia chegado ao mundo como os outros homens, à semelhança dos animais, porque era a encarnação de Deus. Seu corpo era unicamente a expressão de sua alma, que nele atuava para o bem da humanidade. A alma não tem sexo. Esse ideal, não obstante, pode estar muito longe do nosso alcance, mas não o devemos perder de vista, mantendo o propósito de realizá-lo algum dia. Em sua vida, Cristo não teve outra ocupação nem outro pensamento além de que era puro espírito manifestado na carne, porém não sujeito a ela; com sua maravilhosa intuição, sabia que todo ser humano, homem ou mulher, judeu ou gentio, rico ou pobre, justo ou pecador, era a encarnação de seu próprio espírito, embora ainda não manifestado em sua plenitude, como Pai manifestava. Assim, em sua oração do Pai, disse:"Mas rogo não somente por estes, senão também pelos que hão de crer em mim pela palavra deles, a fim de que todos sejam uma coisa, como tu, em mim ó Pai e eu em ti: que também sejam em nós uma só coisa. "Isto não pode significar mais do que anelo de que chegue o dia em que, pela fé do Cristo, possa alcançar os crentes o reconhecimento de sua unidade essencial com Cristo e com Deus. Desse modo, a obra capital de sua vida foi estimular em quantos o seguiam o reconhecimento dessa unidade essencial, dizendo-lhes: "O reino de Deus está em vós."



Equivalia a dizer-lhes que abandonassem as velhas e supersticiosas idéias de que eram vermes desprezíveis da terra e que podiam ser tiranizados como escravos, porque em seu interior estava o triunfante reino de Deus, o espírito divino, invulnerável, eterno, imortal. Jesus jamais fala deste mundo, nem do aspecto do mundo senão para vituperar sua vaidade e exortar aos povos do mundo a que sigam avante em seu aperfeiçoamento, até alcançarem a resplandecente luz de Deus, até que todos reconheçam a divindade essencial de sua natureza e que fique vencida a morte e anulada a aflição, não vamos discutir agora, se há algo de lendário no Novo Testamento, algo de místico relativamente à vida de Jesus Cristo, nem nos importa que os Evangelhos datem de séculos depois de sua morte. O importante é a moral evangélica, idêntica no fundo à moral ensinada por todos os Instrutores que precederam a Cristo. Para a salvação não há necessidade de ciência acadêmica, nem de riquezas, poderio ou fama. Só necessitamos de pureza, porque o espírito é puro por essência e não pôde ser de outra maneira, porque procede de Deus; por isso diz a Bíblia que o espírito é o sopro de Deus e o Corão afirma que é a alma de Deus. Não obstante, está, por assim dizer, encoberto pelo pó das nossas ações e as obscuridades da nossa ignorância. Basta eliminarmos o Ego e as obscuridades, para que o espírito brilhe em todo o seu esplendor. "Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus." "O reino de Deus está em vós.". "Não busqueis o reino de Deus aqui nem ali, porque está em vosso íntimo. Também ensinou Jesus, o Cristo, a renúncia como o melhor meio para eliminarmos as obscuridades que cobrem a luz do espírito como uma capa. O jovem rico pergunta a Jesus: Ó bom Mestre, que farei para conquistar a vida eterna? Jesus responde: Por que me chamas bom? Ninguém é bom senão Deus e se queres conquistar a vida eterna, guarda os mandamentos. O jovem indaga: Quais são? Jesus replica: Não matarás. Não cometerás adultério. Não furtarás. Não dirás falsos testemunhos. Honra o teu pai e à tua mãe e ama o próximo como a ti mesmo. Falou então, o jovem: - Tudo isso observei desde a minha adolescência. Que mais me falta? Respondeu Jesus: - Se queres ser perfeito, anda, vende o que tens, dá aos pobres e terás tesouros no céu; vem e segue-me. O jovem, porém, afastou-se muito triste, sem obedecer ao Mestre, porque era possuidor de multas riquezas. Todos nós somos mais ou menos como esse jovem. A Voz ressoa dia enoite em nossos ouvidos, no meio dos nossos prazeres e alegrias; no meio das coisas mundanas esquecemo-nos das espirituais até que em um momento de pausa ressoa em nossos ouvidos a Voz que aconselha: "Vende quanto tens e segue-me.""Todo aquele que quiser salvar a sua vida perdê-la-á e todo aquele que por Mim perca a vida, a salvará. "Porque todo aquele que renuncia a vida deste mundo por amor a Cristo, conquista a vida imortal.


Swami Vivekananda
  

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